Eu sempre tive medo de me transformar num móvel. Sabe aquela
pessoa da família, um tio ou tia, que ninguém liga, ninguém se preocupa, apenas
sabe que existe? Então, essa pessoa que pode ser confundida com um sofá, um
criado mudo, uma geladeira. Isso sempre me apavorou.
No trabalho tem aquele que as
pessoas têm pena, deixam ficar por ali por que já faz parte da paisagem. Ele
nunca é convidado pra nada, por que sabe né, o Zé não tem bom papo, ele nem
sabe das modinhas e das tecnologias de ponta. Na confraternização de fim de ano
seu nome nem aparece na lista por que ele já faz parte do mobiliário da “firma”
então pra que se preocupar com ele, vai estar lá mesmo.
Esses indivíduos invisíveis me
assustam. Não quero em momento algum da minha vida ser uma pessoa que os outros
olham e não enxergam, que a opinião nem é escudada mesmo que falada em voz
alta. A tia velha e solteirona que a família esquece-se de levar para praia por
que acha que não gosta, mas ninguém nunca perguntou a ela se o mar lhe agradava.
Não sei em que parte da vida esse
pessoa tomou a poção da invisibilidade. Tive varias na minha família, e sempre
eram aquelas que abdicaram da vida pessoal pra cuidar de uma mãe doente, um pai
ou sobrinhos. Tornaram-se esquecidas por que a família se acostumou que o
parente doente ou idoso tinha uma muleta em quem apoiar e esse pedaço de
madeira não reclamava, obedecia. Um dia o idoso se vai e o “cuidador”, que
dedicou sua vida continua lá, como um móvel
velho, esquecido na decoração démodé da casa de infância.
Não quero ser aquela pessoa que
ganha meias nas festividades. Pra mim o ápice do esquecimento é dar meias a alguém.
Você se torna tão pouco importante que o individuo sai pra comprar presentes de
natal para a família e pensa: deixa-me dar uma lembrancinha pra fulano, afinal
ele estará lá. Meias!!! Não me deem meias, nunca, por favor. Ainda aceito
presente do Boticário que no meu ponto de vista também é algo que demonstra a
pouca importância que você tem para os outros. Quando quero presentear alguém
eu penso, eu rodo, eu busco algo que faça a diferença. O Boticário está ali,
para economizar tempo, pensamento, e grana!
Ser invisível é péssimo. Eu já me
coloquei no lugar de pessoas assim. Eu já fui um dia invisível na escola. Era
um bom aluno, um menino que não provocava e nem brigava, era tímido e circunspecto.
Então ficava ali, no canto, sem bullying, mas também sem atenção. Um dia fiz um
feito memorável e então descobriram que eu existia. De lá pra cá eu pelo menos
me faço enxergar. E olha que não preciso usar uma melancia no pescoço e nem criar
polemicas para isso. Um assunto que rende outro post, os super-mega-blaster simpáticos.
Desses eu tenho é medo!
Olhe ao redor, reveja os parentes
da família e pense se não há por perto um ser invisível, o criado mudo. Vá até
ele e dê cinco minutos do seu tempo com um papo descontraído. Escute-o! Quem sabe não estará lhe dando muito mais do
que “meias”. Atenção e ouvido podem fazer mais diferença do que algo material.
Boa quarta feira a todos.
8 comentários:
Caro Rafael, que delicia e cruel rs ler-te, sabe aquelas coisas que ficaram numa gaveta esquecida, mas que encomodam, a história da infância na escola, eu me lembro assim, que coisa triste, mas ao mesmo tempo eu também aprendo a me fazer ser visto, ei eu existo também, sem que isso atraísse bulling rs, perfeito, eu me vi ali...tenho medo também de me tornar naão um ser invisível, mas móvel inútil ( em teses), porque embora eu ecreva (tou de castigo rs) na internet, não quer dizer que queira escreve um livro, virar febre, mas não quero perder o contato com a evolução, mas não passo diso, face, nem pensar rs...e elendo este post , pude ver os seres móveis que estavam lá e ninguém me disse, que existia uma história por trás daquela pessoa, que para mimesteve sempre ali, aprendi, não quero ser um móvel, então mãos à obra...agora não sei o que fazer rs, mas adorei ler este post.
ps. Meu carinho meu respeito meu grande abraço
Vixe nem me fale nisso... durante uma etapa em minha vida, me sentia excluído de tudo, como um fantasminha, perambulava entre as pessoas. No trabalho então, fazia de tudo pra entrar e sair sem cumprimentar ninguém! Muito chato aquela sensação.
Nesse voltar pra Bahia me fez muito bem, me ajudou a sair desse ostracismo, sei lá o que...
Mas de uma coisa eu posso te dizer, você não precisa fazer nada para ser notado, apenas seja você que já está de bom tamanho.
No mais, continue sendo verdadeiro como demonstra ser nos seus relatos!
Forte abraço!!
de há muito tempo eu acordei para a vida e desde então [isto aos meus 42 anos] não abdico dos meus direitos a uma vida plena e abundante ...
Boa tarde ;)
Fala a verdade, você fez esse post por conta da história da tia velha que conversamos no Skype? kkkkkk
Bem, agora falando sério, eu conheço algumas poucas pessoas que estão nessa posição. No meu trabalho mesmo tem uma mulher assim, ela fica falando sozinha e todo mundo conversando e ninguém ouve o que ela diz. Acho isso muito triste. E acho, também, que isso tem muito a ver com uma energia que cada pessoa carrega. Tem pessoas que tem uma energia boa que atraí, outros uma ruim, que repele, a maioria no meio termo disso. E tem aqueles que parecem não emanar nada, são um zero a esquerda.
Eu acho muita coisa ruim de mim, mas acho que não sou essa pessoa zero a esquerda, sou mais do tipo "ame ou odeie"... rs. Mesmo você já sabendo que sou uma tia velha encalhada... kkkkk
Beijocas
Oi Rafael.
Eu entendo esse teu medo, algum tempo atrás tb já passei por isso, e tb tive essas mesmas observações tuas. São coisas que, infelizmente, existem, mas acho que estão ai, para deixarem de existir.
Podemos sim mudar isso, podemos sim e devemos dar mais atenção aos outros, conversar mais. Hoje, infelizmente existe uma cultura que foca muito mais no material, no individual e no que aparenta ter do que realmente no ser; mas não podemos deixar que isso se sobreponha as coias realmente importantes.
Ainda é tempo de virar o jogo, ainda é tempo de aproveitar a vida, de olhá-la com os olhos de uma criança, cheia de esperança e com um foco bom, para as coisas boas. Não digo que devemos relegar a segundo plano o que é triste, mas sim olhar essa tristeza, essa melancolia e achar um modo de transformá-la, achar um modo de criar uma energia que impulsiona cada vez mais para frente.
Vamos lá....bola pra frente, a vida é curta, e o lance é aproveitá-la muito, afinal, nunca sabemos quando ela irá acabar sem avisar.
E por hora, o melhor é aproveitar, bem, como sabemos fazer.
Um grande abraço.
Seu texto me colocou pra pensar... Conheço algumas pessoas assim e sempre me coloquei no lugar delas. Outra coisa que me fez pensar também o quanto me afasto das pessoas e principalmente familiares e que, no futuro, eu me tornarei uma dessas pessoas por preferir sempre a minha companhia e a solidão... Enfim, levei um tapa e vou pensar mais sobre o tema!
Abração!
Olha... tenho certeza que a pessoa que essa pessoa que escreve um texto como essa, não pode mais passar sem ser notada pela vida.
Eu já fui um invisível, e eu era bom nisso, "presença residual zero", eu brincava!!! Mas me custou muito caro!
Mais do que a sensibilidade de olhar e perceber "os invisíveis", penso que o desafio é conseguir ajudá-los a superar esse medo...
Um grande abraço!
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