HISTÓRIAS DE NATAL 2: O CHILIQUE DA VELHINHA

Quando se é criado ao lado de avós, aprende-se a respeitar o idoso de forma diferente. Nunca me referi a meus avós como “você”, sempre houve aquela formalidade do “senhor(a)”, mesmo que em seguida viesse um : pô vó a senhora cagou toda minha brincadeira!!! Mas o respeito estava ali implícito, e nele o limite de até onde podia ir.

Um dos terríveis natais que passei com minha avó começou no dia 23 de um ano aí, bem passado. Ela ficava doente, ou tinha uns piripaques bem nas vésperas de natal ou ano novo. Devia ser algum tipo de depressão que sentia por estar com idade avançada e ter perdido 90% da família. Essas datas trazem lembranças e isso pode gerar um sentimento confuso, que às vezes achamos ser “doença”.

Não deu outra, dia 24 de dezembro a véia me encana de passar muito mal ( na véspera já dava sinais de que algo ia acontecer). Sei lá o que deu nela. Começou a dizer besteiras em delírios que não compreendíamos. Hoje tiraria isso de letra, na época, sem muita experiência nos desesperamos todos.

Vizinhos mais chegados acudiram, por que sempre acontecia do meu pai estar fora, e nesse dia não foi diferente. Ele saiu pela manhã, e como não existia celular, cadê o cara que não chegava nunca? Uma vizinha mais assustada que nós, chamou uma ambulância. Chegam os paramédicos, colocam Dona Mocinha (apelido da minha vó) na maca e tchau, vamos pro hospital. Claro que ninguém quis ir junto, fui eu dentro da ambulância, enquanto minha irmã e mãe iam de carro atrás. A véia lá...catando borboletas e chamando tudo quanto é parente morto e a enfermeira segurando o braço dela.
Achei estranho o caminho que faziam e questionei o motorista. Foi quando me disseram que se tratava de uma ambulância do SUS e todo procedimento que eles atendiam eram filtrados primeiro num posto de saúde da região e não em particulares. Pânico!!! A vizinha imbecil ao invés de chamar a Unimed ou uma ambulância particular, ligou pro SUS. Aí fiquei preocupado de verdade. Não fazia ideia de como seria ou onde me deixariam com a velhinha doente.

Chegamos a um posto que não fazia ideia de onde ficava. Só sei que é na estrada que liga Campinas/Indaiatuba. Colocaram a pobre Dona Mocinha pra dentro e eu lá, atrás, querendo saber onde estava.

Incrível mas a velhinha imediatamente se recuperou e ficou boazinha e lampeira já querendo ir pra casa. Permaneceríamos ali até que os médicos a examinassem. Pois bem, colocaram-na na enfermaria, e eu ali, de soldadinho de chumbo estacado do lado. Dia 24 de dezembro, 10:00 da manhã. Que natal é esse?

Não apareciam médicos, a enfermeira “cuco” de plantão só aparecia pra trocar o soro de hora em hora. A véia tava uma bola de capotão cheia de tanto liquido que injetaram nela. Minha mãe e irmã vendo que ela estava bem foram embora e disseram que quando a liberassem pra ligar. Fiquei la entregue a bactérias e vermes, com uma velhinha que insistia em ir pra casa.

DONA MOCINHA ERA A CARA DESSA VELHINHA DA FRENTE - GORDINHA

Tudo tranquilo, se não fosse um bêbado na maca ao lado ter uma crise de abstinência e começar a urrar. Amarrado a cama, ele gritava pra minha vó: Tia, me tira daqui...porra véia, se mexe. Confesso que estava apreensivo do cara escapar e esfaquear nós dois.

A velhinha estava branca de medo e eu mais ainda. O povo nem tomava conhecimento. Passou alguns instantes aquele homem vomitou uma gorfada de exorcista que voou pro outro canto a sala. Olhou pra nós com os olhos projetados, vermelhos, demoníaco. Minha avó desesperada clamava por socorro. Estava tão lucida e bem que me obrigou a empurra-la pra fora dali.

Eu, franzino, empurrei aquela maca pelo posto de saúde todo, estava fugindo com a velha quando o pessoal da recepção me barrou. Ela xingou tanto a enfermeira, que imediatamente tiraram o soro, deram alta e despacharam a velha e seu netinho magricelo.

Quando saímos daquele lugar estranho, Dona Mocinha se comportava como se estivesse saíndo de um shopping, como se nada tivesse acontecido. O que hoje nos faz crer que essas crises eram mentira ou um começo de esclerose. Pelo menos ao chegar em casa, minha mãe tinha preparado a ceia, e Dona Mocinha sentou-se a mesa como se nada tivesse acontecido e comeu como uma jiboia.
Pra quem tem seus velhinhos em casa e os respeita, é assim que tudo termina. Um dia eles passam mal, em outros se comportam como crianças. Paciência é uma virtude que poucos tem para com os mais velhos.

Boa quinta-feira.

14 comentários:

Lobo disse...

Te juro, no seu lugar teria surtado ahauahuahaua.

Mais do que a velha!

Hospital é um lugar tenso demais pra levar alguém, e ele(a) não ter nada...

Abração Rafa!

Karina disse...

Danadinha essa sua avó... Mas a frase principal desse post é realmente a de que poucos têm paciência para com os idosos. Minha irmã é uma dessas pessoas, mas ela me surpreende, porque vive dando chiliques com os adolescentes e adultos, mas tem uma paciência de jó com as crianças e com os idosos. Vá entender...
Um beijo, Karina.

Mylla Galvão disse...

kkkkkkkkkkkkkkkk
Rafa, eu teria dado uma coça no bêbado!
E sua vó? Era pura solidão e medo de ser deixada sozinha!

bjos

Paulo Roberto Figueiredo Braccini - Bratz disse...

e eu não sei como isto funciona? aqui em casa é assim todo ano com a mamys ... só q euzinho já escolado nem ligo ... ou ligo sim ... levo ela pro chuveiro e dou um banho frio ... ah! sara na hora ... kkkkkkkkkkk ... dizem q sou um monstro ... mas vai por mim ... funciona!

bjux

;-)

o Humberto disse...

KKKKKKK, Rafael, eu ri MUITO aqui.

Cara, já me identifiquei totalmente no 1o parágrafo. Meu pai é 50 anos mais velho que eu e minha mãe 40. Eu sei BEM o que é ter "velhinhos" em casa.

Meu pai tem uma saúde de touro, mas minha mãe é a rainha dos médicos, então achei que ela e Dona Mocinha têm muito em comum (e a irmã que sai fora e deixa vc com o "pepino" é bem a minha tb).

Muito bom. Crescer e conviver em casa com gente mais velha acaba te dando uma noção de vida que outras pessoas acabam não tendo. Vivo dizendo que eu malho pra não ser freguês de hospital na velhice e não pela gostosura, rs.

Bom, os links aí abaixo são de posts sobre os velhos aqui de casa. Qdo der um tempinho dá uma olhada.

Abs!

http://ohumbertoexplica.blogspot.com/2010/10/papo-na-madruga.html

http://ohumbertoexplica.blogspot.com/2010/10/hein.html

http://ohumbertoexplica.blogspot.com/2010/06/days-anatomy.html

Cocada.g disse...

Ola Rafael!

Que dia de louco foi esse ai hein! Cara eu não consigo didar com situações como essas... a pessoa passar mal perto de mim é pedir pra morrer porque eu simplismente me desespero e não consigo fazer nada. Parece que mesmo sem experiencia vc segurou as pontas,,, e esse bebado do hospital hahhaha!

abraços!

Márcia de Albuquerque Alves disse...

kkkkkkkkkkkkkkkkkkk Rafa é assim mesmo que funciona, com eles a gente aperfeiçoa a virtude da paciência kkkkkkkk bjs

Arsênico disse...

ai ai... ainda bem que minha avó paterna tinha uma nora incrível como a minha mãe porque nos últimos 2 anos ela ficou tipo a sua avó...

Me faltava paciência... tinha dias que ela cismava que haviam roubado seus três filhos caçulas... no qual o mais novo é meu pai... então imagine!

Tenho medo de ficar velho e acabar dando esses barracos e estressando todo mundo!!!

Quero ser um velhinho adorável! kkkkkkkk!

***

aBraço

;-D

Andreza disse...

...Imformo que este tal posto é PS São José (bairro)...na maioria das x sus é atendido lá mesmo...já passei por isso tbm...mas sem bêbados...o que torna um pouco mais calmo...rsrsrs...lembrete:se o destino assim permitir chegaremos a está fase com ou sem chiliques...rsrs
Bjks dcoe ♥.

Dêco disse...

Rafa, eu tenho uma avó morando comigo e te garanto: é preciso paciência, respeito e MUITO amor para entendê-la. A minha avó fica enclausurada no quarto, nada faz, e sempre que planejamos alguma viagem, ela fica doente - UMA DOR DE CABEÇA que nem TRAMADOL passa.
Logo, nunca pode haver uma viagem em família. Nem a casa de outros filhos ela quer ir.
Mas eu sempre estou arrancando sorrisos dela. Abraçando e tentando compreendê-la, mesmo quando às vezes parece impossível.

Cris disse...

lá vai o Garoto na ambulância, porque ninguém quis ir...e lá vai o garoto na noite de natal !
E lá vem as lembranças de sonhos que ficaram na gaveta. E ficam; não tem como.

Acho que o natal de 2011 vou trazer vc aqui pra casa.........rs

Seria tão bom se pudéssemos ser uma ilha. Juro que não sinto solidão. Não sofro desse mal e realmente no fundo, família é uma tremenda preocupação. É e sempre será!
Ontem eles, amanhã nós!

beijo

Ana Flávia disse...

Passou alguns instantes aquele homem vomitou uma gorfada de exorcista que voou pro outro canto a sala. Olhou pra nós com os olhos projetados, vermelhos, demoníaco.

VOCÊ NÃO EXISTE!!!
JURO!
ESTOU MORRENDO DE RIR AQUI...
BEIJOS E ÓTIMA SEXTA

..::voy::.. disse...

sei bem como eh esses postos no fim do mundo com bebados amarrados nas macas...
#EnfermeiroModeOn

bjs do voy

Dona Sra. Urtigão disse...

Ri muito...(e como preciso disso, agradecida). Conheço bem essas historias, trabalhei mais de 30 anos em posto do SUS. Só vou fazer uma ressalva ao seu texto prefeito, é que este comportamento não é:
1 . padrão das velhinhas (existem muuuuuuitas - a maioria, que não atua assim)
2.exclusivo das velhinhas ( muitos adultos jovens de todos os sexos agem assim )
Mas enfermeira CUCO é perfeito !

PARABENS, voce tem um ótimo blog, vou continuar minha visita e passeio por aqui, voce é meu escolhidodehojequevaleapena